E no começo a
Flip era só programação principal. Ainda bem que hoje isso mudou. Não porque as
mesas da programação principal não sejam merecedoras de aplausos, nesse ano
tivemos mesas bem atrativas, unindo literatura, política, jornalismo,
arquitetura, ciência, memória... Porém, a cada ano que passa fica mais difícil
comprar ingressos, que se tornou tarefa árdua e heroica e esse ano foi o
primeiro que não consegui um ingresso sequer para a tenda dos autores, o que me
deixa preocupada pelos anos seguintes. Essa edição da Flip teve corte no
orçamento. Culpa da inflação? Os patrocinadores preferiram apoiar a Copa e não
sobrou muito para a literatura? Erro fatal! Devido à economia, não houve a
Tenda do Telão, mas teve telão ao ar livre e é claro que teria que ser
gratuito, haja vista o público ter ficado ao relento e debaixo do sol. Os
deuses da literatura devem ter feito um acordo com São Pedro e para sorte
daqueles que tiveram de se contentar com o telão, não choveu. Definitivamente,
o show de abertura aberto ao público e sem cadeiras foi mais empolgante e Gal
Costa não deixou que sentíssemos falta do conforto dos anos anteriores. Na Praça da Matriz, nada daqueles bonecos temáticos, apenas as variadas letras de Millôr e não houve um que não quisesse fazer uma foto na letra de seu nome.
O lado bom de
não conseguir ingressos foi que a Flip cresceu para os lados e as programações
paralelas já superam a principal. A Flipinha apresentou boas atrações para
todas as idades. A Flip Mais, na Casa de Cultura, nos brindou com Adriana
Calcanhoto (sempre maravilhosa e simpática) em Versos de Risco – do Hai-kai à
poesia marginal, que no final da conversa teve a paciência magistral de
autografar seu novo livro e fotografar com todos os fãs, um por um, sempre
sorridente; o emocionante Em Nome do Pai, com Marcelo Rubens Paiva e Ivo Herzog, falando
sobre o momento traumático que viveram na época que seus pais foram vítimas da
ditadura e o comediante Reinaldo, do Casseta & Planeta regeu
uma conversa sobre Millôr Fernandes, o homenageado do ano. O Instituto Moreira
Salles, Casa Rocco e Casa Folha não ficaram para trás, trouxeram Ruy Castro, Guilherme
Arantes e Frei Beto. O SESC ofereceu oficinas com Ninfa Parreiras (literatura
infantil), Marcelino Freire (Formas Breves- essa eu fiz!) e dramaturgia. Além dessas atrações, essas casas ainda ofereceram um agrado ao público presente: petiscos, espumantes, vinho tinto, cerveja... Muitas vezes foi difícil encontrar uma brecha para entrar. A Casa do Autor Roteirista, em seu segundo ano, também inovou com oficinas de
áudio-visual e roteiros, essa com Adriana Falcão, roteirista da Grande Família.
Ofereceu palestras com diretores e autores da TV Globo, saraus de poesias e
textos de autoria dos organizadores da Casa, Thelma Guedes e Newton Canito,
lidos por artistas globais (Nanda Costa, Marcos Caruso, Ângelo Antonio, Murilo
Rosa e Leona Cavalli). Estreando na Flip, o SENAC teve a brilhante ideia de
oferecer o Cozinhando com Palavras, uma casa gastronômica onde chefs, como
Francisco Lelis e André Bocatto e aprendizes falaram sobre a arte da cozinha, desde
os menus do tempo do império até a necessidade de reaproveitamento alimentar. E
tudo com direito à degustação dos pratos feitos aos nossos olhos. Que voltem em
2015.
Por
tudo isso, não ter ingressos para a Tenda dos Autores foi a melhor coisa que me
aconteceu esse ano. Tive tempo para fazer a Oficina de Marcelino Freire que
durou 3 dias e que acrescentou muito ao meu conhecimento e aprimoramento na
escrita de contos, microcontos e minicontos. Do lado de fora, a arte, a cultura
e a literatura explodiam para todos os lados e nos contagiavam com a vontade de
obter mais e mais. O único momento que parei à frente do telão foi para assistir
Fernanda Torres e Daniel Alarcón na mesa Romance em Dois Atos.
Paraty,
com os dias ensolarados e as noites frias estava aconchegante e deslumbrante
como sempre, mas, estruturalmente, agonizava com tantas pessoas, tendo seu pico
no sábado, quando milhares de pessoas invadiram as ruas e a ponte sobre o rio
Perequê. Encontrar um restaurante para almoçar foi trabalhoso e um teste de
paciência. As operadoras de telefonia estavam mortas, dificultando o pagamento com
cartão nos estabelecimentos. Desconforto para os clientes, que tinham de pagar
em dinheiro e confusão para os proprietários. Mas nada pior do que ver
comerciantes aumentarem o preço das mercadorias aos nossos olhos, preços que já
estavam exorbitantes. Mas isso não é culpa da Flip, trata-se do jargão da Lei
de Gerson de querer levar vantagem em tudo.
Não
há o que falar mal da Flip, pelo contrário. Como já disse, a Flip extrapolou a
Tenda dos Autores e fervilha do outro lado do rio, no Centro Histórico. Que
continue assim nos outros anos e eu não precisarei lamentar a dificuldade de
conseguir um ingresso para a programação principal.
Denise Constantino
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